Femininos

Thiago Prado
“Não se nasce mulher: torna-se mulher” (Simone de Beauvoir)
Mulheres não podem ser reduzidas ao feminino. Mas o que é ser feminino? Ou, o que pode ser feminino?
Artistas, professoras, cantoras, drag queens, escritoras, modelos, engenheiras, cientistas, boxeadoras, presidentas, mães, casadas, solteiras, jovens, anciãs. E até ser um homem feminino, não fere o meu lado masculino, como cantou na década de 80 Pepeu Gomes.
O feminino pode estar em todos nós. Embora seja a mulher quem é educada a expressá-lo em nossa cultura.
E se assim é, a quem interessa a pressão estética que mulheres cis e trans recebem para buscarem caros procedimentos de "feminização"?
Talvez aprender com o feminino seja o caminho para fazermos menos guerras.
Talvez esse seja o super-homem sobre quem Gilberto Gil canta em sua canção homônima:
"Um dia
Vivi a ilusão de que ser homem bastaria
Que o mundo masculino tudo me daria
Do que eu quisesse ter
Que nada
Minha porção mulher que até então se resguardara
É a porção melhor que trago em mim agora
É que me faz viver"
Retrato assim nessa série oito expressões de femininos:
Alana Crilanovichs, mestra em Língua Portuguesa (UFRJ), pedagoga e professora e sua filha Marina Crilanovichs que adora ler, cantar e brincar no mar.
Aleteia Daneluz, artista visual e atriz.
Alexia Twister, drag queen, vencedor do Prêmio Shell de Melhor Ator (2025).
Anna Muylaert, diretora de cinema, premiada dentro e fora do país.
Clarissa Croisfelt, cantora, escritora, PCD.
Elle Ferraz, modelo, mulher trans.
Ligia Francilino, escritora, artista visual, autista.
Nisete Sampaio, artista visual, graduada em Filosofia (UFRJ).
Preta Evelin, doutoranda em Artes Cênicas (Unirio).
MAMMA
Quando chegamos próximos à comemoração do Dia das Mães, nos deparamos com a noção de que ainda no século XXI ser mãe talvez seja a figura máxima da "natureza feminina". Visto que um amor incondicional, superior estaria ligado a esse papel. Já que poucos se lembram que homens trans também podem gerar filhos.
A filósofa francesa Elisabeth Badinter descontrói a ideia do amor materno como um instinto inato no livro "O mito do amor materno" (1985). Ao nos confrontar com fatos históricos que mostram que o amor materno como conhecemos foi criado, ficamos livres, inclusive enquanto filhos, para aceitar e receber de nossas mães o amor conquistado, o amor possível. Liberamos a figura materna para ser uma pessoa e não uma força sobrenatural disposta a tudo pelos filhos.
A partir disso, apresento essa série de cinco obras criadas em parceria com meu eu de 2005.
Dois elementos foram essenciais: uma única fotografia que tirei da minha mãe — sem qualquer produção, usando uma câmera digital de baixa resolução da época —, e sobre a qual pós-produzi digitalmente, criando diversas personas; e registros que fiz de uma pintura autoral que fora perdida para sempre em um lixão por motivos que me abstenho de declarar.
Naquele momento, no entanto, a minha máquina não correspondia aos meus anseios artísticos. Vinte anos depois, só agora pude então finalizar esse trabalho.
O FEMININO EM MIM
Desde criança tenho preferência por retratar personas femininas. Desenhos e mais desenhos. Às vezes atribuía-lhes nomes e histórias. Meus cadernos escolares eram cheios delas. Ao iniciar na pintura, vi-me no abstracionismo.
As figuras só voltaram a aparecer junto à arte digital. Foi então que comecei a produzir de novo representações dos femininos.
Por isso, trago também obras do meu acervo particular. "Uau!" (2020), inspirado na atriz Maria Flor, a partir de sua personagem "Flor Pistola", que personifica o embate entre a raiva e o humor frente à tragédia, evoca a "in" consciência coletiva da pandemia. E os objetos criados com sapatos categorizados como "femininos", retomando à série "Chamada em Caminhada" que apresentei pela primeira vez em 2015 em São Paulo, discutem questões acerca da comunicação e da tecnologia.
Thiago Prado
Abertura
10 / MAIO / 2025
AVA Galeria - Fábrica Bhering
Rua Orestes, 28 - Santo Cristo
Rio de Janeiro - RJ